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Projeto de Lei de Bases da Habitação deu entrada no Parlamento

| 26-04-2018
A criação de um regime de requisição temporária de habitações devolutas, a definição de mecanismos de proteção no despejo e a criação de um regime especial de fixação de renda são algumas das medidas inscritas no Projeto de Lei de Bases da Habitação, apresentado pelo PS.
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A criação de um regime de requisição temporária de habitações devolutas, a definição de mecanismos de proteção no despejo e a criação de um regime especial de fixação de renda são algumas das medidas inscritas no Projeto de Lei de Bases da Habitação, apresentado pelo PS.

O Grupo Parlamentar do Partido Socialista (PS), coordenado pela deputada Helena Roseta, entregou no Parlamento, no dia 19 de abril, o Projeto de Lei de Bases da Habitação, um quadro geral de princípios e regras que pretende nortear a legislação subsequente e a atuação dos poderes públicos e privados no âmbito das opções políticas de habitação. O objetivo, estabelecido naquele diploma, é o de «garantir a todos o acesso efectivo a uma habitação condigna», um direito constitucionalmente protegido e de que «o Estado é o principal garante».

Entre outras medidas previstas no diploma destaca-se a introdução do conceito de requisição temporária, para fins habitacionais e mediante indemnização, de habitações injustificadamente devolutas ou abandonadas. Diz o Projeto de Lei que «as habitações que se encontrem injustificadamente devolutas ou abandonadas incorrem em penalizações definidas por lei, nomeadamente fiscais e/ou contraordenacionais» e, acrescenta, «podem ser requisitadas temporariamente, mediante indemnização, pelo Estado, pelas regiões autónomas ou por autarquias locais, nos termos e pelos prazos que a lei determinar, a fim de serem colocadas em efectivo uso habitacional». O diploma esclarece ainda que, no decurso da requisição, se mantém a titularidade privada da propriedade. Na exposição de motivos, os autores do projeto lembram que a possibilidade de requisição de bens de propriedade privada está prevista no número 2 do artigo 62.º da Constituição da República Portuguesa e também se encontra «já contemplado no Código das Expropriações, embora com um alcance limitado». Destacam, além disso, a existência em Portugal de uma «enorme quantidade» de habitações devolutas ou abandonadas.

Regimes de fixação de renda e de proteção no despejo

Além de dedicar um capítulo ao ‘acesso a casa própria’, incluindo normas relativas ao crédito à habitação e aos condomínios, o Projeto de Lei do Grupo Parlamentar do PS dá uma atenção especial ao ‘acesso ao arrendamento’. Nesse âmbito, prevê «o desenvolvimento, pelo Estado, de uma política tendente a estabelecer um sistema de renda compatível com o rendimento familiar», contemplando, para o efeito, «a previsão legal de diferentes regimes de fixação de renda adaptados às realidades dos agregados familiares», designadamente, de renda apoiada (em que o valor da renda é fixado em função do rendimento do agregado familiar), de renda condicionada (em que o valor da renda não pode exceder um limite fixado na lei, calculado em função do valor patrimonial tributário do imóvel) e de renda acessível ou limitada, em que «o valor da renda é fixado dentro de um intervalo de valores que correspondam, consoante as tipologias, a uma taxa de esforço significativamente inferior a 40% do rendimento disponível dos agregados familiares». Neste contexto, e em consonância com a Nova Geração de Políticas de Habitação, apresentada a 23 de abril pelo Governo, «o Estado privilegia e discrimina positivamente, no âmbito da promoção do arrendamento, a existência de contratos de arrendamento sem termo ou de longa duração». Prevê-se também «a promoção de um mercado público de arrendamento dirigido às camadas mais vulneráveis», devendo o património habitacional público ser disponibilizado, em regra, nos regimes de renda apoiada ou condicionada. Ainda em linha com a Nova Geração de Políticas de Habitação, o Projeto de Lei estabelece que o Estado deve promover a existência de seguros de renda ou mecanismos de garantia mútua alternativos à necessidade de obtenção de fiador.

O diploma estabelece também um regime de «proteção e acompanhamento no despejo», quando esteja em causa a primeira habitação. «As entidades públicas não podem promover o despejo forçado ou a demolição de habitações precárias de indivíduos ou agregados familiares vulneráveis sem garantir previamente soluções alternativas de alojamento», considerando-se que o despejo é forçado «quando a privação da habitação habitual e permanente é devida a uma situação de insolvência ou insuficiência económica do indivíduo ou agregado familiar nela residente, ou ao facto de se tratar de uma habitação precária». Por outro lado, o despejo de primeira habitação «não se pode realizar nos meses de inverno nem no período nocturno, depois das 20 horas ou antes das 8 horas, salvo em caso de emergência, nomeadamente incêndio, risco de calamidade ou situação de ruína iminente».

O diploma prevê ainda a criação de um novo órgão de consulta do Governo no domínio da habitação, o Conselho Nacional de Habitação, «com competências de acompanhamento e de envolvimento da sociedade civil na programação de políticas de habitação».

Alojamento local requer autorização de utilização específica

O Projeto de Lei consagra uma distinção entre uso habitacional, decorrente dos instrumentos de gestão territorial, e autorização de utilização para fins habitacionais, a conceder pelos municípios e que exclui fins de natureza turística. Assim, «a utilização concreta de um imóvel ou fracção para fins habitacionais carece de autorização de utilização conferida pelo município», ao passo que «a utilização de um imóvel ou fracção habitacional como estabelecimento hoteleiro ou como alojamento local temporário, cedido a turistas mediante remuneração, requer autorização de utilização específica para esses fins, a conferir pelos municípios da área, e implica o cumprimento dos respectivos requisitos legais e regulamentares».

Em matéria de fiscalidade, diz o diploma que a lei deve discriminar «positivamente a tributação de rendimentos provenientes de arrendamentos de longa duração relativamente aos rendimentos provenientes de outros modos de fruição de imóveis, nomeadamente como estabelecimentos hoteleiros ou em regime de alojamento local com fins turísticos».

ALP considera inconstitucional a requisição de habitações devolutas

A possibilidade, prevista no Projeto de Lei, de requisição temporária e mediante indemnização de habitações devolutas ou abandonadas não foi bem recebida pela Associação Lisbonense de Proprietários (ALP), que considerou a proposta «inconstitucional, típica de um estado totalitário». As palavras são de Luís Menezes Leitão, presidente da associação, que, em declarações à Lusa, admitiu que «provavelmente vamos levar isto às instâncias internacionais». Para o presidente da ALP a "constituição garante, no artigo 62.º, que a requisição só se pode fazer mediante utilidade pública, o que não será o caso nesta situação, e mediante o pagamento justo de indemnização".