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Alteração ao regime das SIGI aproxima Portugal do modelo internacional dos REITs

Fernanda Cerqueira | 19-09-2019
A primeira alteração, por apreciação parlamentar, ao regime das Sociedades de Investimento e Gestão Imobiliária (SIGI) «teve o mérito de melhorar o regime e aproximá-lo dos standards internacionais».
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As palavras são de Filipa Arantes Pedroso, sócia da Morais Leitão, e espelham o otimismo do mercado imobiliário nacional, auscultado no XI Seminário IMOjuris – ‘O novo regime das SIGI’, no dia 17 de setembro, em Lisboa. «Foi feito um grande esforço para explicar e demonstrar ao Governo que, ou se fazia algo dentro dos parâmetros internacionais, ou não valia a pena sequer tentar fazer algo nesse campo. E acabou por ser reconhecido por todos, sem exceção, a necessidade de não afastar o regime português da indústria dos REITs», sublinhou a advogada.

Conduzida pelos sócios das áreas de prática de imobiliário, fiscal e mercado de capitais da Morais Leitão, a sessão teve o apoio da Associação Portuguesa de Promotores e Investidores Imobiliários (APPII), que se fez representar pelo seu vice-presidente executivo Hugo Santos Ferreira, e contou ainda com a participação de João Cristina, diretor em Portugal da Merlin Properties, Victor Freitas Duarte, diretor de novos veículos de investimento da Sonae Sierra, António Gil Machado, director da Vida Imobiliária, e João Nóbrega, sócio da RSA Advogados.

A alteração introduzida pela Lei n.º 97/2019, de 4 de setembro, ao Decreto-Lei n.º 19/2019, de 28 de janeiro, que aprovou o regime das SIGI, veio esclarecer alguns aspetos que não resultavam claros no regime anterior. «Em primeiro lugar, foi incluído o regime fiscal aplicável às SIGI, o qual não constava do regime anterior», começou por referir Paulo Núncio, sócio da Morais Leitão e especialista em direito fiscal. O preâmbulo do Decreto-Lei 19/2019 previa que ‘as SIGI beneficiarão do regime fiscal neutro aplicável às demais sociedades de investimento imobiliário que se constituem e operam de acordo com a legislação nacional’, o que «era uma resposta, mas não era clara». O regime fiscal aplicável estava «implícito no preâmbulo» mas não era isento de dúvidas, «uma fragilidade que punha em causa todo o regime». Com esta alteração «foi expressamente consagrado que o regime fiscal das SIGI é o regime fiscal aplicável aos Organismos de Investimento Coletivo, previsto no Estatuto dos Benefícios Fiscais». Os rendimentos de capitais, os rendimentos prediais e as mais-valias auferidas pela SIGI passam a estar expressamente excluídos de tributação em IRC. O regime fiscal prevê, no entanto, que os rendimentos resultantes da alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis só poderão beneficiar da exclusão de tributação se os imóveis forem detidos pela SIGI durante pelo menos três anos, para arrendamento, incluindo formas contratuais atípicas que incluam prestações de serviços necessárias à utilização do imóvel.

As restantes alterações introduzidas pela Lei 97/2019 incidiram, essencialmente, sobre o objeto social, as regras de composição do ativo e as regras relativas à dispersão do capital (free float), matérias que foram analisadas e esclarecidas pelos sócios da Morais Leitão, João Torroaes Valente e Eduardo Paulino.

Para Hugo Santos Ferreira, vice-presidente executivo da APPII, deste conjunto de alterações resultou «um regime que, não sendo perfeito, está próximo disso». As SIGI «são um produto simples, que permite que qualquer investidor invista num ativo que paga uma renda», assim operando uma verdadeira «democratização do investimento».

Por resolver ficaram ainda algumas questões relacionadas com a ‘participation exemption’, com a composição do ativo (saber se os imóveis detidos por subsidiárias contam para o ratio de 75% em investimento imobiliário ao nível da Holding SIGI) e com a exclusão, ou não, da tributação de subsidiárias imobiliárias.

Para quando a primeira SIGI?

A importação do regime dos REITs, através da figura das SIGI, «chega na altura certa, num momento em que Portugal é um destino de investimento e há um interesse crescente por parte dos investidores», afirmou Hugo Santos Ferreira. «Os REIT chegam a Portugal com um atraso de dez anos comparativamente a Espanha, mas não podemos esquecer que as SOCIMI espanholas chegaram quando o país mais precisava de alavancagem. Em Portugal a alavancagem já está a acontecer. As SIGI são uma boa oportunidade de trazer um novo perfil de investidor imobiliário», referiu ainda o responsável da APPII. Opinião partilhada por António Gil Machado, diretor da Vida Imobiliária, para quem as SIGI «trazem para o imobiliário um novo campeonato, uma nova gama de investidores, que não investe diretamente em imóveis, mas em veículos que investem em imóveis».

Os milhares de milhões que a indústria de REIT representa na Europa, cerca de 286 mil milhões em 2018, segundo dados da European Public Real Estate (EPRA), aguçam a vontade de antecipar resultados em Portugal. «Há muita pressão para haver uma primeira SIGI em Portugal», reconheceu Hugo Santos Ferreira. António Gil Machado considera que «não devemos desacreditar neste regime se durante os dois ou três primeiros anos só surgirem uma ou duas SIGI. É um processo normal, foi assim em Espanha».

As luzes parecem cair sobre a Merlin Properties. Contudo, João Cristina, diretor em Portugal daquela que é uma das maiores Socimi espanholas responde apenas que «ainda é cedo», mas «estamos atentos». Contudo, confirmou que, tal como anunciado, a Merlin Properties vai entrar no mercado de capitais português com os mesmos ativos que tem cotados em Espanha. «É um processo de ‘dual listing’», isto é, «a mesma empresa cotada em dois mercados diferentes». Isto porque, «mais do que um player em Espanha, a Merlin quer ser um player Ibérico».

Uniformizar, ‘standardizar’ foram as linhas mestras na construção do regime

Também Vítor Freitas Duarte, diretor de novos veículos de investimento da Sonae Sierra​, que lançou com o Bankinter a Socimi ORES, reconheceu nas SIGI «um mecanismo simples, atrativo e que partilha um funcionamento que já é reconhecido internacionalmente».

Opinião comungada por João Nóbrega, sócio da RSA Advogados e especialista em veículos de investimento imobiliário, para quem «estamos cada vez mais a aproximar-nos do regime internacional, o que é positivo». Porém, «para ter escala, o mercado destes REITs vai ter de ser ibérico», alerta o advogado.

Este seminário decorreu no auditório João Bernardino Gomes, localizado no LEAP Amoreiras, Espaço Amoreiras – Centro Empresarial, em Lisboa, e integra o ciclo de Seminários IMOJURIS 2019, encontros regulares entre profissionais do setor imobiliário para debater diversos temas da atualidade jurídica com impacto no setor.