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Especialistas dão nota positiva às alterações ao alojamento local

Fernanda Cerqueira | 11-02-2025
Após um período marcado por alguma instabilidade legislativa, os players do mercado do alojamento local antecipam uma progressiva consolidação do setor. Este foi o sentimento partilhado pelo painel do primeiro seminário Imojuris deste ano.
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As novas regras do alojamento local, aprovadas pelo Decreto-Lei n.º 76/2024, de 23 de outubro, representaram bem mais do que a revogação de muitas das medidas inscritas no âmbito do programa "Mais Habitação". O alcance e impacto desta alteração legislativa foi debatido no seminário "Alojamento Local: O que esperar em 2025", promovido pelo Imojuris, Abreu Advogados e a Faculdade de Direito da UCP – Escola do Porto, com o apoio da ALEP – Associação Portuguesa do Alojamento Local, APEGAC – Associação Portuguesa de Empresas de Gestão e Administração de Condomínios, Confidencial Imobiliário e Vida Imobiliária, no dia 4 de fevereiro, no auditório Corticeira Amorim, na UCP Porto – Campus Foz.

Em vigor desde novembro, o Decreto-Lei n.º 76/2024, de 23 de outubro, representa, em parte, um “regresso ao passado”, comentou Maria Santa Martha, Sócia da Abreu Advogados, explicando que esta alteração “veio restabelecer um conjunto de medidas anteriores ao Mais Habitação”. Entre as alterações mais significativas destacou a revogação das restrições na abertura e na transmissão de novos registos, mas também a eliminação da suspensão de novos registos de alojamento local, da reapreciação e necessidade de renovação, em 2030, dos registos já emitidos, ou ainda, da caducidade dos registos inativos.

Porém, esta alteração não se limitou a revogações e trouxe também algumas novidades. “Há a atribuição de uma maior competência aos municípios, que através dos regulamentos municipais podem regular a atividade de alojamento local no seu território e estabelecer áreas de contenção e áreas de crescimento sustentável”, referiu. É, ainda, criada a figura do provedor do alojamento local, “um mediador” para dirimir potenciais diferendos.

Um ponto quente desta alteração”, assinalou Maria Santa Martha, foram as alterações aos poderes do condomínio. A revogação da obrigatoriedade de decisão prévia e unânime da assembleia de condóminos a autorizar a instalação de alojamento local em frações autónomas foi percecionada de diferentes formas. Foi muito veiculada a ideia de uma perda de poder dos condomínios, mas quer a ALEP quer a APEGAC consideram que estas alterações foram positivas. Para Vítor Amaral, não obstante esta alteração ter ficado “aquém do que podia ser”, no que diz respeito à propriedade horizontal a alteração “foi positiva”. Na sua opinião, a suposta perda de poderes do condomínio é “aparente”, explicando que “os condóminos muitas vezes agem não pelo interesse comum do condomínio, mas por interesses particulares” e, nessa medida, “retirar este poder aos condomínios faz sentido porque criou-se uma relação que conjuga os interesses das duas partes, quem reside e quem investe”. Eduardo Miranda, por seu turno, considerou que “a ideia de que os condomínios tinham mais poder na redação anterior da lei era uma mentira. Um condomínio alcançar a unanimidade é verdadeiramente difícil”. Uma ideia partilhada por Maria Santa Martha, para quem “com estas medidas, ficamos mais perto de soluções de equilíbrio”.

Arrendamento volta a ser alternativa ao alojamento local

Observando a evolução da atividade do alojamento local, Ricardo Guimarães, Diretor da Confidencial Imobiliário, explicou que “em resultado do aumento das rendas no arrendamento tradicional, o alojamento local é só uma alternativa. Há uma nova capacidade do lado dos proprietários para escolher entre uma atividade e outra”. Para o especialista, trata-se de uma oportunidade importante, porque “esta migração de imóveis do alojamento local para o arrendamento vai permitir uma maior profissionalização do setor”. Ressalva, no entanto, que “o setor do alojamento local começa também a manifestar uma necessidade de se renovar" e “não há capacidade de renovação num setor que está fechado a novos registos e aberturas”. Nesse sentido, observou, “não sei até que ponto faz sentido manter este racional de contenção quando o próprio mercado está a encarregar-se de ajustar a oferta”.

Direito à habitação vs direito à livre iniciativa económica privada

O debate que envolve o alojamento local surge invariavelmente associado à ponderação entre dois direitos, “o direito à habitação e o direito à livre iniciativa económica privada”, comentou Rita Henriques, Docente na Faculdade de Direito da UCP Porto. “Esta alteração de 2024 deu prevalência à livre iniciativa privada”, disse. “Neste confronto direito à habitação vs direito à iniciativa privada, a questão é se devemos permitir a exploração de alojamento local em imóveis destinados a habitação. E este era o objetivo do referendo sobre o alojamento local em Lisboa, apresentado em dezembro ao Tribunal Constitucional”. A decisão chegou com o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 1/2025. “Além de várias vicissitudes formais, o Tribunal Constitucional decidiu que, pese embora todas as competências acrescidas, os municípios não podem estabelecer que um imóvel não pode ser destinado a alojamento local”.

Convidado para este debate, moderado por Ana Afonso, Docente na Faculdade de Direito da UCP Porto, António Barros, Chefe de Divisão Municipal do Alojamento Local da Câmara Municipal do Porto, disse que no Porto “continua a ser fundamental que o direito à livre iniciativa económica privada possa funcionar”. E, por isso, “no Porto não proibimos, definimos requisitos, critérios, regras e quem cumpre com essas condições pode abrir o seu alojamento local”, frisou.