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Novo Simplex Urbanístico reduz prazos e aumenta a responsabilidade dos intervenientes

Fernanda Cerqueira | 11-12-2025
O Parlamento já recebeu a proposta do Governo de revisão do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação (RJUE). A proposta simplifica procedimentos e reduz prazos, transferindo para os promotores e técnicos a responsabilidade pelo cumprimento integral das normas legais. Na senda do Simplex de 2024, a fiscalização municipal é sucessiva, mas o prazo para este controlo é reduzido de dez anos para um ano.
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Créditos da imagem: © Heye Jensen | Unsplash

Era um compromisso do Governo, aguardado com expectativa pelos profissionais do setor da construção e do imobiliário. A Proposta de Lei de Autorização Legislativa para a revisão do RJUE deu entrada na Assembleia da República no início deste mês. No documento, que já inclui o Decreto-Lei autorizado, o Governo explica que as alterações propostas pretendem resolver «dificuldades de articulação e aplicação pelas diversas entidades intervenientes», em especial no âmbito do RJUE.

Em linha com o Simplex Urbanístico de 2024 (Decreto-Lei n.º 10/2024, de 8 de janeiro), esta revisão simplifica procedimentos, encurta prazos, mas equilibra a equação com uma maior responsabilização dos intervenientes. O Governo assume explicitamente que «a progressiva simplificação procedimental (...) carece de ser acompanhada do incremento proporcional da sua [leia-se, dos intervenientes] autorresponsabilização». Assim, na generalidade das operações urbanísticas a realizar em áreas cujos parâmetros urbanísticos se encontrem efetivamente definidos, prevê-se que o interessado possa proceder à sua execução após a submissão da comunicação prévia, sem estar dependente de qualquer ato administrativo. Isto porque, a comunicação prévia das operações urbanísticas «deve integrar uma efetiva assunção de responsabilidade por parte do interessado», «quer pela entrega dos elementos instrutórios necessários, quer pelo cumprimento integral das normas legais e regulamentares aplicáveis à operação».

A análise a efetuar pelos serviços municipais «deve ocorrer num único momento e incidir sobre a validade formal e material das operações urbanísticas como um todo», sem prejuízo da «possibilidade de fiscalização, a todo o tempo, da conformidade das operações com os projetos apresentados». Nesse sentido, «devem ser reforçados os recursos municipais em matéria de controlo sucessivo e das ações sistemáticas de fiscalização, bem como os mecanismos de responsabilização efetiva dos promotores, em caso de incumprimento».

Consoante a operação urbanística em causa, a proposta prevê uma responsabilidade solidária, não só dos promotores e donos da obra, mas também dos empreiteiros, diretores da obra e responsáveis pela fiscalização.

O prazo de caducidade do controlo sucessivo municipal da conformidade legal e regulamentar dos projetos é substancialmente reduzido, passando de dez anos após a comunicação prévia, para um ano a contar da data de pagamento das taxas e encargos devidos, ou, se for anterior, com o início da utilização do imóvel. Por outro lado, clarifica-se que «o âmbito da fiscalização municipal relativa à segurança e salubridade diz respeito à edificação, devendo as situações de arrendamento irregular, e outras que não sejam de competência municipal, ser reportadas às entidades legalmente competentes em razão da matéria».

Prazos de decisão são drasticamente reduzidos

Com esta revisão, a informação prévia continua a assumir-se como um «procedimento preferencial» para a confirmação da viabilidade das operações urbanísticas. Este instrumento, «quando incida sobre todos os parâmetros urbanísticos necessários», garante um «enquadramento seguro», que permite a isenção da licença ou comunicação prévia, além de conferir «maior celeridade na execução».

Em matéria de licenciamento, são eliminados os prazos globais indexados à área bruta de construção e repõe-se «a relevância dos prazos intercalares», para «permitir o respetivo ajustamento à complexidade efetiva das operações».

Todos os prazos de decisão são drasticamente reduzidos e, decorridos os prazos previstos, os pedidos consideram-se tacitamente deferidos. Para dar resposta a Pedidos de Informação Prévia (PIP) Simples, a Câmara Municipal (CM) passará a ter um prazo de 15 dias e, nos PIP qualificados, 20 dias (ou 45, quando se reporte a operações de loteamento).

A CM delibera sobre o pedido de licenciamento no prazo máximo de 20 dias, no caso de obras de edificação e demolição, 30 dias no caso de obras de urbanização e trabalhos de remodelação de terrenos, e 45 dias no caso de operações de loteamento. Os prazos «podem ser excecionalmente prorrogados por uma única vez e por metade desse período», mas apenas em situações de «especial complexidade da operação, designadamente no caso de operações de loteamento que envolvam obras de urbanização».

Uma das alterações mais importantes é a obrigatoriedade de entregar todos os elementos instrutórios e pareceres de entidades externas no requerimento inicial. Adicionalmente, passa a admitir-se apenas uma entrega de elementos de alteração ao projeto na sequência da audiência prévia dos interessados, quando a mesma vise a correção das desconformidades detetadas.

Simultaneamente, é reduzido de dez para um ano o prazo para eventual declaração de nulidade dos atos administrativos previstos no RJUE.

No que respeita às taxas, procede-se ao alargamento da possibilidade de o pagamento ser efetuado por autoliquidação, o que se admite não apenas no âmbito da comunicação prévia e das operações isentas, mas também na sequência do deferimento tácito do pedido. Ainda neste âmbito, é reposta a opção por formas de pagamento alternativas à Plataforma de Pagamento da Administração Pública, «a fim de assegurar a adaptação gradual dos municípios». 

Regresso do conceito de título urbanístico

Na realização de negócios jurídicos que envolvam a transmissão da propriedade de prédios urbanos, deve constar do contrato se o imóvel dispõe ou não de título urbanístico. Retoma-se, assim, o conceito de ‘título’ como documento que deve, «em prol da segurança jurídica e da eficácia probatória que se exige perante terceiros», conter uma síntese dos elementos essenciais da operação urbanística em causa, e ainda, no caso da licença e da comunicação prévia, o comprovativo de pagamento das taxas e demais encargos devidos. Segundo a proposta, este título «deve ser aceite como elemento probatório bastante para a legitimidade da execução da respetiva operação e para os demais efeitos legais, inclusivamente no campo das transações imobiliárias».

São igualmente introduzidos alguns ajustamentos ao regime da utilização dos edifícios ou frações. Assim, os edifícios ou frações cujas obras tenham sido submetidas a procedimento de licenciamento ficam posteriormente sujeitas a uma mera comunicação prévia para efeitos da sua utilização. Nos demais casos, concluída a obra, deve ser apresentada uma comunicação prévia com prazo, permitindo, assim, a realização de uma vistoria pela CM para «verificação da conformidade das operações».

Além de uma maior flexibilização dos procedimentos e responsabilização das partes interessadas, as alterações propostas pretendem também clarificar alguns conceitos, entre os quais os de ‘obras de reconstrução’ e de ‘edificação’, esclarecendo-se igualmente que as operações de loteamento, ainda que meramente jurídicas, são também operações urbanísticas. Assim, uma obra de reconstrução que comporte um aumento do volume do edifício ou fração deve ser enquadrada como uma obra de ampliação. E uma alteração ao projeto após o decurso das respetivas obras carece necessariamente de ser tramitada enquanto procedimento de legalização. Nesse sentido, as obras de reconstrução mantêm-se isentas de procedimento de licenciamento ou comunicação prévia porque «passam a constituir uma mera reposição da situação do último antecedente válido do edifício ou fração». A isenção passa a ser igualmente aplicável às operações de reconstrução de imóveis situados em zonas de proteção de imóveis classificados ou em vias de classificação. E, nestes imóveis, passa a ser classificada como de escassa relevância urbanística a substituição dos materiais dos caixilhos dos vãos por outros que, conferindo acabamento exterior idêntico ao original, promovam a eficiência energética. A execução de obras isentas depende do pagamento prévio das taxas devidas, «em especial quando tenham sido precedidas de uma informação prévia que contenha todos os elementos identificativos dos parâmetros urbanísticos da operação».

Clarifica-se também que a afetação de parcelas a habitação pública, de custos controlados ou para arrendamento acessível tanto pode resultar na cedência para o domínio privado do município, como pode ser assegurada em propriedade privada a promover pelo loteador. A área dos lotes ou parcelas afetas a construção de habitação de custos controlados ou para arrendamento acessível de natureza privada é contabilizada para efeito do cumprimento dos parâmetros de dimensionamento relativos a habitação pública, de custos controlados ou para arrendamento acessível, não dando lugar a cedência ou compensação para esse fim. O objetivo é incentivar a criação de oferta privada de habitação acessível, em complemento da oferta pública.

São ainda repostas e ajustadas algumas contraordenações, nomeadamente, a realização de operação urbanística que não se encontre devidamente titulada, a execução de obra sem a informação de início dos trabalhos ou sem os elementos que devem ser juntos à informação de início dos trabalhos, a submissão de comunicação prévia ou da comunicação prévia com prazo sem os elementos instrutórios necessários à sua apreciação e o não envio do comprovativo do pagamento das taxas.

No que respeita à legislação de urbanismo e construção, a plataforma eletrónica SILUC (Sistema de Informação sobre Legislação do Urbanismo e da Construção) é assumida como base para a publicitação da relação das disposições legais e regulamentares a observar pelos técnicos.

A revogação do Regulamento Geral das Edificações Urbanas (RGEU), prevista no anterior Simplex para 1 de junho de 2026, é ajustada no sentido de produzir efeitos apenas com a «entrada em vigor do diploma que definir as normas técnicas aplicáveis à edificação», regulamentação que «deve contar com a colaboração das ordens profissionais competentes na definição das regras de ordem técnica que considerem adequadas para a preparação dos projetos relativos às edificações urbanas».

A Proposta de Lei n.º 48/XVII/1.ª deu entrada na Assembleia da República no dia 2 de dezembro. Se for aprovada, prevê-se que o respetivo Decreto-Lei autorizado entre em vigor no primeiro dia útil do terceiro mês seguinte ao da sua publicação, aplicando-se aos procedimentos que se iniciem após essa data.