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Reforma e simplificação dos licenciamentos ambientais produz efeitos a partir de março

Tiago Cabral | 13-02-2023
Foi publicado em Diário da República o Decreto-Lei n.º 11/2023, de 10 de fevereiro, que procede à reforma e simplificação dos licenciamentos ambientais. O diploma aprova medidas para reduzir os encargos, eliminar licenciamentos e simplificar os procedimentos administrativos sobre as empresas, com especial enfoque na área ambiental.
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Aprovado no quadro do SIMPLEX, o diploma visa iniciar a reforma de simplificação dos licenciamentos existentes, através da eliminação de licenças, autorizações, atos e procedimentos dispensáveis ou redundantes em matéria ambiental, «simplificando a atividade das empresas sem comprometer a proteção do ambiente» e «passando a Administração Pública a ter um enfoque especial na fiscalização, corresponsabilização e autocontrolo por parte dos operadores económicos», lê-se no preâmbulo do diploma.

A licença ambiental deixa de ter prazo de validade e de ser renovada ao fim de 10 anos. Porém, continua a ser necessário o procedimento para alteração da licença quando se verifiquem alterações substanciais da instalação industrial ou quando seja necessário atualizá-la nos casos previstos na lei, em nome da proteção do ambiente.

Dispensa-se a licença ambiental em certas instalações do setor químico sem escala industrial (por exemplo, quando esteja em causa a experiência de uma nova tecnologia, a preparação final de produtos em loja, a produção em estabelecimentos comerciais e as pequenas atividades de fabrico artesanal), e é dispensado o título de emissões para o ar para quem já tem ou poderá vir a ter licença ambiental.

Deixa de ser obrigatória a contratação de entidades acreditadas ou verificadores ambientais para obter a licença ambiental ou para enviar reportes ambientais.

É criado o Reporte Ambiental Único (RAU) em matéria ambiental, por forma a simplificar e desmaterializar obrigações de reporte, eliminando-se repetições e unificando num único website todos os reportes.

Os edifícios novos ou sujeitos a obras deixam de estar obrigados a ter instalações de gás.

Em matéria de resíduos, é eliminada a necessidade de obtenção de licença de resíduos quando esteja em causa um estabelecimento industrial que já tenha obtido um título abrangido pelo Sistema da Indústria Responsável (SIR), substituindo-se a licença por um parecer vinculativo.

Avaliação de impacte ambiental tem novas regras

Em matéria de avaliação de impacte ambiental (AIA) procede-se à redução dos casos de realização de procedimentos de AIA em situações em que tal dependa de uma decisão discricionária das entidades competentes (análise caso a caso), para projetos localizados fora das áreas sensíveis. Por exemplo, deixa de ser necessário realizar uma análise caso a caso para verificar se será necessário realizar uma AIA na indústria alimentar, indústria têxtil, dos curtumes, da madeira e do papel e da borracha, quando se localizem em parques ou polos industriais que distem mais de 500 m de zonas residenciais e ocupem uma área inferior a 1 ha. E o mesmo vale para operações de loteamento urbano em zona urbana consolidada ou que ocupem uma área inferior a 2 ha.

Simultaneamente, reduz-se o conjunto de situações em que é obrigatória a AIA, mantendo-se, contudo, a possibilidade de análise caso a caso. Por exemplo, deixa de ser obrigatório um procedimento deste tipo para projetos de centros eletroprodutores de energia solar quando a área ocupada por painéis solares e inversores seja igual ou inferior a 100 ha.

E, em determinadas situações, elimina-se totalmente a necessidade de realizar procedimentos quer de AIA obrigatória quer de avaliação caso a caso, como ocorre, por exemplo, com a modernização de vias ferroviárias e com as alterações ou ampliações de projetos nas áreas de produção e transformação de metais, indústria mineral, química, alimentar, têxtil, dos curtumes, da madeira e do papel e indústria da borracha.

No caso de parques ou polos de desenvolvimento industrial e plataformas logísticas é dispensada a realização de AIA quando já tenha sido realizada avaliação ambiental estratégica relativamente aos mesmos, sem prejuízo da eventual necessidade de AIA relativamente aos projetos específicos aí a instalar.

O diploma simplifica também o procedimento de AIA relativo a certas infraestruturas de serviços públicos nas áreas da água, energia elétrica, gás natural, gases de petróleo liquefeitos canalizados, transportes públicos e telecomunicações em corredor próprio, criando a figura da análise ambiental de corredores. O promotor poderá optar por seguir esse procedimento para identificar as opções ambientalmente mais adequadas à infraestrutura que necessita de construir para o projeto, sem necessidade de realizar uma AIA em fase de anteprojeto. Com a decisão obtida, a qual deve identificar e aprovar todas as opções de corredores ambientalmente aceitáveis, poderá então ser realizada uma AIA em fase de projeto de execução.

São também evitadas duplicações, como a necessidade de realizar procedimentos e obter atos permissivos (licenças e autorizações), quando as questões já foram analisadas em sede de AIA realizada com base num projeto de execução e viabilizadas através de declaração de impacte ambiental (DIA) favorável ou favorável condicionada. Assim, após obtenção da DIA favorável, expressa ou tácita, deixa de ser necessário realizar qualquer procedimento adicional quanto a essas matérias. É o caso, por exemplo, da comunicação prévia à comissão de coordenação e desenvolvimento regional quanto a projetos localizados em áreas de Reserva Ecológica Nacional, do parecer para utilizações não agrícolas em áreas de Reserva Agrícola Nacional, ou das autorizações e pareceres previstos no regime geral da proteção da natureza e da biodiversidade.

Certificação dos deferimentos tácitos

O diploma cria também um mecanismo de certificação dos deferimentos tácitos, de forma gratuita e desmaterializada. Assim, prevê-se que uma entidade administrativa a designar deva, num prazo muito curto, emitir um documento que servirá para comprovar perante qualquer entidade administrativa, incluindo inspeções e entidades policiais, que a licença ou autorização foi obtida por deferimento tácito.

«Este mecanismo terá particular relevância em matéria ambiental, onde existem vários casos de deferimento tácito, mas será de aplicação generalizada a todos os deferimentos tácitos previstos no ordenamento jurídico, de forma a permitir aos interessados que, com segurança, possam fazer valer os seus direitos obtidos por efeito da ausência de uma resposta da Administração dentro do prazo previsto na lei», refere o preâmbulo do diploma.

Em matéria de AIA, estabelece-se que os prazos para deferimento tácito se contam desde o momento da receção do estudo de impacte ambiental e não desde o momento do pedido «devidamente instruído», o que, na prática, permitia que o prazo apenas se iniciasse quando a Administração Pública o entendesse. Quanto à licença ambiental, determina-se que o deferimento tácito ocorre com o mero decurso do prazo. Já no regime da utilização dos recursos hídricos, o deferimento tácito forma-se, na ausência de decisão expressa, após o decurso do prazo legalmente estabelecido.

Determina-se ainda que as entidades incumbidas de realizar procedimentos administrativos apenas podem solicitar por uma única vez novos documentos, esclarecimentos, elementos complementares ou informações ao interessado. Sempre que isso aconteça, o prazo de decisão não fica suspenso, desde que o particular responda à solicitação no prazo geral de 10 dias úteis. Apenas se o particular não cumprir esse prazo é que o prazo de decisão fica suspenso e apenas pelo período de tempo entre o 11.º dia e a data do envio dos elementos solicitados. Além disso, determina-se que a prática de certos atos deve ser concentrada e realizada simultaneamente, por forma a que o procedimento não fique sucessivamente parado enquanto se aguarda pela resposta ou pronúncia do interessado.

Determina-se também que os pareceres não podem ser emitidos fora do prazo previsto na lei. Assim que esse prazo seja ultrapassado, em vez de insistir na solicitação do parecer ou de continuar a aguardar pelo mesmo, a entidade responsável pelo procedimento fica obrigada a avançar com o mesmo. Por outro lado, o prazo geral para emissão de pareceres é reduzido de 20 para 15 dias úteis.

Renovação automática das licenças de utilização de recursos hídricos

A renovação das licenças de utilização de recursos hídricos passa a ser automática caso não existam alterações, dispensando o interessado de realizar um procedimento para renovação da licença.

É adotado o princípio de apenas um título de utilização de recursos hídricos por operador.

E, no caso de obras para construção de infraestruturas hidráulicas e captação de águas para aproveitamento de recursos hídricos particulares, é substituída a necessidade de uma licença por uma mera comunicação prévia quando esteja em causa a realização de construções inseridas em malha urbana com plano diretor municipal de segunda geração, e quando esteja em causa a recuperação de estruturas já existentes sem alteração das características iniciais.

Esta reforma entrou em vigor no dia 11 de fevereiro e produz efeitos a partir de 1 de março de 2023.

O regime do Reporte Ambiental Único e a certificação do deferimento tácito apenas produzem efeitos a partir de 1 de janeiro de 2024.

As medidas previstas no diploma aplicam-se aos procedimentos administrativos em curso.